Não foi sem querer que me atrevi a sonhar. Nem foi por acaso que resolvi me tornar uma pessoa com quem gosto de conviver. Não foi sem perceber que minha imagem no espelho foi se adequando aos meus gostos. Nem foi sem sentir que fiz dos meus dias algo que me orgulhe de relembrar. Estive pensando a esse respeito esta tarde; e a conclusão a que cheguei é que se há algo em nossa vida que faz a diferença, é a intencionalidade.
As pessoas - e aqui me incluo - podem ser muito injustas com o tempo, colocando sobre ele uma responsabilidade além da que lhe compete. Dizem que o tempo cura, que apaga, promove ou degrada. Dizem que o tempo é o senhor de todas as coisas. Hoje eu desconfio que ele simplesmente passa. Nós é que agimos, enquanto ele se vai.
O tempo é correnteza que não se deixa deter, que não se permite represar. É um regato, onde nós depositamos barquinhos de papel que lá se vão para o futuro: um sonho, um fato, uma oportunidade, afetos, expectativas. Ele carrega, mas não faz nenhum dos barcos. Tudo o que jogamos em seu leito precisou, primeiro, ser criado por nós - seja por nossas escolhas, ou pela falta delas. É a tal da intencionalidade.
Creio que viver de propósito seja um dos maiores presentes que podemos nos dar. E falo de coisas pequenas, como enxergar o ambiente à sua volta, sentir o cheiro das coisas, fazer escolhas conscientes, ouvir as pessoas atentamente, fazer o seu melhor no trabalho, apreciar o sabor dos alimentos e - por que não - sonhar de verdade. Ora, se vamos mesmo encher os dias de barcos de papel, por que não fazê-lo com aqueles que escolhemos usar? Por que não colorir a correnteza do tempo com as nuances que nos aprazem?
Não podemos controlar tudo. Seria infantil esperar que pudéssemos. Todavia, há um ou outro ponto da vida que estão, sim, disponíveis para escolhermos. E são esses, os que fazem a diferença entre as pessoas que estão vivendo e as que apenas existem . A cada vez que nos voluntariamos para assumirmos a responsabilidade por nossas próprias escolhas, uma frota de dias selecionados a dedo é colocada nessa correnteza que passa apesar de nós.
Não importa de quantos barquinhos seja feita a nossa história. O que interessa é quantos deles foram realmente dobrados por nós. E se há uma falha da qual a consciência nunca deveria ter a oportunidade de nos acusar, que seja a de ter vivido sem querer.
Beijinhos
Fê Coelho
0 comentários:
Postar um comentário