quinta-feira, 27 de junho de 2013

Aos mestres, com carinho



Num dos poemas que mais amo no mundo inteiro, Cummings disse "honra o passado, mas acolhe o futuro". Acho que esse é um meio-termo bastante aceitável, quando nos deparamos com grandes mudanças.

Acolher o futuro requer coragem. Caminhar para aquilo que não se conhece é um desafio para qualquer pessoa, porque temos ideias pré-concebidas do que enfrentaremos; assim como temos as histórias e experiências de outras pessoas para pensarmos a respeito. Quando o poeta falava sobre acolher, acredito que ele tinha em mente algo maior que simplesmente aceitar por não ter alternativa. Não! Acolher é permitir que o futuro chegue, sem crivá-lo de perguntas constrangedoras; é conhecê-lo aos poucos e não apenas suportá-lo como um hospede incômodo. Acolher é ser gentil, baixar a guarda e permitir que o futuro seja tão bom quanto possa ser. Isso exige muito de nós.

Para acolher o futuro precisamos de desapego, bom-humor, esperança e maturidade. É necessário serenidade para não ver um gigante em cada moinho por que passamos. E principalmente, precisamos acreditar no bem que virá. Acolher o futuro é, antes de mais nada, um exercício de fé.

Honrar o passado é exercício de gratidão. É uma maneira bonita de reconhecer o bem que recebemos; um jeito bacana de dizer "muito obrigada pelas lições". Honrar o passado não é fazer dele um lugar cor de rosa, nem desconsiderar as lições que doeram. Pelo contrário; honra seu passado aquele que ergue a cabeça, permite um sorriso aos lábios e vai em direção ao futuro, certo de ter consigo as ferramentas necessárias para bem viver.

É assim que me sinto: no momento exato para dizer que sim, sou muito grata por tudo o que aprendi e pelos tesouros que adquiri em termos de conhecimento, amizades e de valores humanos.

Deixo aqui registrada a minha gratidão a cada uma das pessoas por quem passei nesses últimos anos. Aprendi com cada um de vocês coisas que nenhum livro poderia ensinar.

Acolho o futuro que virá e prometo me esforçar para agir, trabalhar e viver bonito. Porque acredito firmemente que quem faz o melhor no futuro demonstra para sempre genuína gratidão ao passado.

Muito obrigada, de coração.
Beijos
Fê Coelho

quinta-feira, 20 de junho de 2013

Levanta-te e anda, Brasil!



Ontem minhas filhas me perguntaram por que estava todo mundo nas ruas, brigando. Para responder à questão, falei brevemente sobre os impostos que pagamos e sobre o destino inapropriado que muitas vezes esse dinheiro recebe. Discorri um pouco sobre o que é corrupção e sobre a importância de se votar com consciência. Para elas, isso foi o bastante; para mim não.

Passei o dia todo refletindo, incomodada com pensamentos recorrentes acerca de como a gestão do país historicamente favorece uma minoria em detrimento da massa. E cheguei a uma pergunta: como vou explicar isso para as minhas filhas? Como vou dizer que vivo num país em que o dinheiro de quem ganha um salário mínimo vai parar na cueca de gente sem escrúpulos? Como vou explicar por que tanta gente morre nas filas dos hospitais, por falta de recursos, profissionais, remédios e - não vamos tampar o sol com a peneira - boa vontade? Como é que se explica o fato de termos pessoas vivendo abaixo da linha da miséria, enquanto obras são superfaturadas e BIlhões são desviados vá saber para onde?

Mas a pergunta que me incomodou mais foi "como deixamos isso acontecer?". Quero dizer, sempre soubemos que nossos impostos eram altos demais e que o retorno era muito pouco. Sempre soubemos que havia gente impune ditando as regras; assim como sabíamos que nossas escolas estavam em situação abaixo esperado. Sempre soubemos que os professores eram desvalorizados, que o cidadão está cada vez mais preso e a bandidagem está mais solta que o arroz da minha mãe. Por que permitimos?

Recordo-me das aulas de geografia na escola, quando tive um dos melhores professores por quem passei. Era uma figura ímpar, parecidíssimo com o Patropi, chamado Zé Pereira. Esse professor fez por mim algo que nunca vou poder agradecer propriamente: ele me ajudou a pensar um pouco melhor. Foi em suas aulas que ouvi falar de mais valia e pilantragem generalizada. E foram essas aulas que me fizeram olhar com novos olhos as fotografias das manifestações políticas por que o nosso Brasil passou. Confesso: depois do Zé Pereira, passei a sentir uma pontinha de inveja daquelas pessoas nas fotos em preto e branco.

Cheguei à conclusão de que aquelas pessoas tinham mais coragem do que eu; que tiveram voz e que por sua luta algumas coisas acabaram por mudar. E lembro-me de pensar que eu vivia em uma geração que não tinha assim, tanta graça.

E é por isso que estou orgulhosa de ver o povo indo às ruas: porque sempre imaginei que minha geração seria marcada por cuecas endinheiradas, contas no exterior e falcatruas no Congresso Nacional. Pensei que não teríamos nenhum capítulo nos livros de história, mas (delícia das delícias!) me enganei.

Espero que quando os levantes arrefecerem, não nos esqueçamos dos motivos pelos quais eles começaram. Torço para que o recado das ruas fique gravado no coração dos brasileiros, para que alguma mudança efetiva se processe. Espero sinceramente ver coisas práticas acontecendo, a honestidade virando moda e a consciência sendo despertada.

Estou orgulhosa do meu povo. Sim senhor! Fique aqui o recado: minha geração pode até ser aquela que desce até o chão; mas também sabe ir às ruas.

Levanta-te e anda, Brasil!

Fê Coelho




quinta-feira, 13 de junho de 2013

Crônica de Quinta: A Fé e a Escada




Disse Martin Luther King Jr., "Dê o primeiro passo com fé. Você não tem que ver toda a escada. Você só precisa dar o primeiro passo". Sabem de uma coisa? Eu acredito nele. Quem me conhece pessoalmente, quem acompanha meus dias sabe disso: andei vivendo pela fé. Subi degrau por degrau, uma escada enorme, cujo fim eu não tinha a menor ideia de onde ficava; mas subi. E acontece que cheguei ao final de um dos lances. Acredito que isso me dê um mínimo de propriedade para falar com vocês sobre um assunto delicado: a fé.

Não pretendo discutir doutrina, religião ou divindades. Quero falar apenas da fé - essa capacidade que temos de acreditar em algo que não é palpável, que não se pode ver ou provar. Quero falar dessa certeza que temos cá dentro do peito e que tantas vezes guia nossos passos. Falemos do primeiro degrau, quando não se vê a escada, mas tem-se a confiança de que ela está lá. Na maior parte das vezes não é fácil fazer isso. Permita-me o leitor, descartar as atrocidades que já foram cometidas em nome de crenças ou pela falta delas e concentrar-me nos efeitos que eu experimentei em função da fé.

De imediato, acreditar que a estrada vai - como diz a música da banda Los Hermanos - além do que se vê, me permitiu o consolo. Quando os dias são muito difíceis, é preciso ter algo que amenize a situação. A fé fez isso por mim. Nos momentos mais complicados, eu me recordava que nem por um segundo eu estava sozinha; havia alguém que olhava por mim e que trabalhava a meu favor. Crer fez com que eu tivesse a sensação de que cumpria passos para algo maior, como se tomasse um remédio amargo que faria passar uma dor crônica. Essa certeza de que havia um plano me sustentou, manteve meu sorriso e permitiu que eu subisse um degrau por vez. Eu não podia ver todo o caminho; mas a cada curva que se revelava, crescia a confiança de que dias melhores viriam. A isso, eu chamo esperança.

Viver pela fé me permitiu exercitar a paciência. Por mais que queiramos, nem sempre podemos apressar as coisas. Os melhores frutos são os que amadurecem a seu tempo. E eu tive que aprender isso. Aprendi também que se você está trabalhando por algo, sendo digno e verdadeiro, cultivando amizades valiosas e acreditando sem reservas, as chances de sucesso são enormes. Boas sementes dão bons frutos. O que precisamos entender é que elas necessitam do seu tempo para se fortalecerem e só então procurarem a luz do sol.

Ah! leitor, mas quando as coisas acontecem... Quando finalmente enxergamos o caminho que trilhamos e entendemos que não, nossa vida não foi um amontoado de dias aleatórios, esse é um dia feliz além da conta! Ter passado pelo crivo da fé me ajudou a saborear as vitórias. Ter acreditado tanto e, justamente por isso, batalhado incansavelmente, deu um sentido absolutamente novo a tudo o que fiz nos últimos anos.

Acho que é mais ou menos isso: um degrau por vez, acreditando que a escada está lá. Porque no final das contas a decisão de não desistir já é uma forma de ganhar.

Beijinhos
Fê Coelho.



quinta-feira, 6 de junho de 2013

Carta Aberta ao Meu Irmão Caçula



Não pedi por você. Nunca me perguntaram se eu queria um irmão menor, branquelo, de bochechas enormes e vivíssimos olhos escuros. Não checaram meu interesse em levar para casa um menino que ia roubar meu colo, pegar meus brinquedos, chorar o tempo todo e fazer os adultos falarem feito bobos. Ninguém quis saber a minha opinião, mas você foi pra casa assim mesmo. A barriga da mamãe sumiu e você apareceu. O jeito foi lidar com a situação.

Durante vários anos, tive um passatempo: implicar com você. Ah! vai dizer que não era bom?! Pobre dona Marlene, tendo que aturar um desenho do Tom & Jerry ao vivo, todos os dias. Era implicância demais, por motivo de menos. "Olha ele me olhando!"; "olha ele me encostando!"; "olha ele existindo! Não dá pra devolver?". Claro que também brincávamos, quando não estávamos brigando. Como nunca fui uma pessoa de muito mimimi, você era a chance de brincar de golzinho, corrida de tampinha e subir em árvore. Nunca te expliquei muito bem, mas mesmo àquela época, eu já te amava desesperadamente. É que esses conceitos são muito vagos para os corações infantis. Criança não precisa de tanta definição.

Prova de que, não, eu não queria te devolver, é o sentimento de proteção que sempre tive por você. Não sei bem como a gente explica certas coisas. Tem palavra que não aceita cair do pé. Embora eu gostasse muito de brigar contigo, esse era um direito só meu. "Não mexa com o meu irmão" - esse era o espírito. Sempre fui ruim pra brigar com outras pessoas, mas não me esqueço um dia que bateram em você na escola. Acho que poucas vezes eu consegui ficar tão brava até hoje. E assim se desenrolou uma história de estica e puxa, em que a gente cresceu, amadureceu, aprendeu a conversar e fortaleceu laços e amor. 

O tipo de amor que se tem por irmãos mais novos é engraçado. Ali tem um pouco de tudo: amor de amiga, amor de irmã mais velha, de irmã mais nova, de tiete e até de mãe. É bonito demais ver alguém que nem dentes tinha - que chorava se esquecia o dever de casa - crescer, se desenvolver e virar um Homem. E veja bem, não estou falando moço, nem rapaz. Estou dizendo Homem de verdade, do tipo íntegro, responsável e provedor. Estou falando do tipo de homem que eu admiro e que, sem nem saber, torcia para que você se tornasse. Como dizemos no nosso Querido Estado de Goiás, você não deitou com as cargas! Foi construindo um caminho admirável, se tornando sempre melhor. Bom poder dizer isso: tenho orgulho de você.

Sei que o que temos é um amor que nos une, que vai e volta. Sei que você também tem essa coisa de proteger. Há um dia específico em que você foi um pai. Tenho certeza de que você se lembra e quero que saiba que não me esqueço. Pois rasguemos a seda do mundo inteiro! Estou muito orgulhosa das suas conquistas, do futuro que você está construindo. Não li uma linha do que você leu, não chutei uma só pedra do caminho que você percorreu, mas permita-me pegar carona na sua felicidade.

Como eu disse pra Geo há uns dias, "te amo muito mais do que poderia caber num texto curto, escrito por uma pessoa de vocabulário reduzido".

Arrocha, Dinho!
Te amo.

Beijão
Nanda 
(ele não me chama de Fê Coelho, fazer o quê. rsrsrs)












terça-feira, 4 de junho de 2013

Lia



Da janela aberta, Lia observava a noite avermelhada de inverno. As nuvens desfilavam inatingíveis, tangenciando aqui e ali algum pensamento solto. Desligou todas as luzes, fechou os olhos, inspirou profundamente e permitiu que o ar frio trouxesse consigo a calma.

Sentia-se cansada, pesada de lembranças que não queria mais carregar. Sabia que seus dias eram o amontoado das escolhas que fizera, assim como o futuro era todo lacunas a serem preenchidas. E o Beto? Bem, ele era um idiota. Só isso.  

Abriu os olhos. Brincou com algumas lembranças ternas, como um bebê que admira um móbile. Os bebês crescem. Ela também crescera. E assim como os móbiles, aquelas memórias agora pareciam absolutamente fora de contexto.

A chaleira começou a chiar. O chá. A chaise. A blusa de lã em volta de si. A bebida quente. O gosto de maçã com baunilha. O Beto. Um idiota. As lembranças se desfazendo. A voz de James Blunt baixa e melodiosa no player. Um suspiro.

"Ah! vontade de ficar apaixonada!". Tomou mais um gole do chá. 
"Passou".

Fê Coelho
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