quarta-feira, 9 de maio de 2012

Nova Carta ao Senhor Futuro



Apenas alguns meses passados, Senhor Futuro, e cá estou eu a repetir algumas palavras. Fico imaginando se esse será sempre um hábito - o de me repetir. Considerando o Senhor Passado e o Senhor Presente, talvez eu possa afirmar que essa seja uma tendência natural - minha ou de todos os mamíferos bípedes dependentes de energia elétrica e clichês, vá saber. Prefiro, todavia, não fazer essa inferência, visto que projeções são a sua especialidade e tenho me provado um solene fracasso no desempenho de suas funções.

Permita-me confessar uma coisa, Senhor Futuro: tenho medo do tempo. Assusta-me esse correr vertiginoso de segundos, essa sucessão de fatos e dias, esse turbilhão de momentos - que não controlamos, não retemos e cujos frames simplesmente nos escapam. Amedronta-me esse eterno modificar de bebês, que viram crianças dentro do que parece ser uma reviravolta da Terra - piscadela a que os humanos chamam ano.  Atemoriza-me a capacidade do tempo para modificar, encerrar, ruir, assorear, corroer e, paradoxalmente, fazer surgir coisas.  O tempo traveste as situações, embaça as cores e as mistura de uma maneira que já não sabemos o quão dourado ou escuro algo realmente foi. Ou será o oposto? Acha, Senhor Futuro, possível que o passar do tempo apenas nos mostre as cores reais, sem a falsa ilusão do novo? 

Talvez eu nunca vá saber essa resposta. Nem o senhor. Consideremos que o novo é tudo o que você conhece.  Pensando melhor, nem o novo é sua jurisdição. Seu trabalho, Senhor Futuro, localiza-se no campo das especulações, daquilo que não se sabe, do que não se pode palpar. Realizou-se, virou presente. E o presente é algo absolutamente quimérico. O Senhor Tempo se encarrega de levar o presente pra lá, como a Roda Viva do Chico. 

Andei pensando em fazer um acordo contigo, Senhor Futuro. Andei considerando a hipótese de apenas te aceitar, sem querer torcer seus eixos ao redor das minhas expectativas. Andei pensando sobre a possibilidade de permitir às minhas Preocupações - tão ativas, tão altivas, tão insistentes - um momento de descanso. Andei ponderando sobre isso: quem sabe eu consiga te libertar da obrigação de atender a cada um dos meus planos embrionários para um Futuro Brilhante. Andei pensando em te aceitar. Verbo e ponto final, sem condições. 

Talvez eu consiga. Talvez seja apenas isso o que o Senhor espera de mim. 

De qualquer forma, por precaução, diga ao Senhor Tempo que não me ressinto de sua passagem como sopro. Diga a ele que compreendo sua forma de agir. Apenas peça a ele que me trate com suavidade, que não faça de minha história um amontoado de coisas desconexas. Suavidade, Senhor Futuro, é tudo o que peço ao Senhor Tempo. Suavidade e Sabedoria. Acredito que esses dois ingredientes nos permitirão uma conversa agradabilíssima, quando nos encontrarmos. 

Suavidade e Sabedoria. Acho que deve ser o bastante para nos proporcionar um bom encontro, quando chegar o momento em que tudo se torne Passado.

Beijinhos
Fê Coelho.

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