Viver é enterrar sementes, refleti dia desses, enquanto
dirigia para o trabalho. O sol ainda nascia. A estrada à minha frente me
lembrava das cobertas que tão sonolenta abandonei. E tive certeza: cada dia é
um novo plantio. Todo alvorecer traz consigo o germe do que ainda está por vir,
daquilo que supomos, sonhamos ou negamos. Cada amanhecer encerra em si uma gama
de possibilidades. É como se nos levantássemos para isso: plantar.
Um bom dia que se deseja é simpatia plantada no coração do
outro. Os olhares, os sorrisos, as intenções, as ações e omissões – tudo isso é
semente lançada em terreno fértil. E não se engane, cedo ou tarde elas acabam
dando frutos. Por onde passamos, em
todas as relações que estabelecemos lá estão eles nos lembrando do tempo do
plantio, da oportunidade aproveitada ou perdida de se escolher a semente certa.
As sementes que plantamos podem nos render árvores frondosas,
sob as quais descansamos após anos. Tanto tempo depois, ainda se pode ver o
resultado do plantio. Da mesma forma, podem se tornar espinheiros, que nos
ferem e atravancam o caminho. Tudo passa pelas escolhas, pela intenção de
plantar, pela decisão de viver.
Viver intencionalmente é escolher o que se vai semear. É não
sair por aí apenas lançando ações ao acaso. Viver por querer é ter coragem de
separar os frutos que se pretende plantar. Ora, não creio que alguém espere
semear laranjas e colher alfaces. Da mesma forma que não se pode espalhar
discórdia e esperar ter em troca aquela paz duradoura e amparada por ombros que
sempre souberam que podiam se apoiar nos seus. Viver por querer é preencher a
própria história com fatos, gostos, afetos e doações.
Claro, não se pode escolher as sementes que plantam em nós.
Nem sempre, pelo menos. Muitas vezes somos brindados com algumas com as quais
preferiríamos não lidar. Tristeza é coisa que aparece, desamor também. A
verdade que plantamos pode não ser a que recebemos. Somos terreno arado e
fértil, mas temos a opção de escolher que árvores serão adubadas e regadas.
Podemos simplesmente não alimentar aquilo que não acrescenta.
Isso é viver bonito, creio eu. Isso é uma maneira de manter
o olhar atento, os sentidos aguçados. É uma forma de tentar tirar o melhor de
cada momento em que estamos por aqui, nesse mundão velho e sem porteira. Ter a consciência
de que todo dia é um plantio nos faz entender que cedo ou tarde os frutos chegam. E que
sejam doces. E que sejam de paz. E que nos façam crer que cada dia de semeadura valeu a pena.
Beijinhos
Fê Coelho.
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