quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Um Bilhete a Morfeu



Chega de mansinho esta noite, Morfeu, trazendo consigo meus sonhos mais lindos? Se aninha ao meu lado e  canta uma canção nova, cheia de doçura e de novidade? Me fala de coisas que não sei se existem, de lugares novos e me ajuda a voar bem de leve, bem longe, bem livre?

Não tenha pressa, Morfeu, que a noite é toda nossa. Se demora, que a aurora está longe, que os sonhos ainda nem começaram. Derrama um bocadinho de areia em meus olhos e me embala, pra presente, pra entrega, pra viagem, pro que os sonhos quiserem. E fica aqui. Entre as cobertas, entre os segundos e além do tempo, fazendo o hoje virar ontem; fazendo o amanhã virar hoje. Sempre mais suave e mais belo.

Acolhe, Morfeu, meu cansaço e faz dele poesia.

E quando o dia raiar, se esconda. Vá embora levando consigo o som de minha respiração distraída, despreocupada. Deixa comigo essa espera por novos sonhos, por novos dias e por um amanhã reluzente de esperança. Tempera o dia com o sabor dourado do crepúsculo, quando provavelmente estaremos esperando um pelo outro.

Boa noite.
Fê Coelho

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Aos Trinta Anos



Tenho cá comigo que as pessoas têm a mania de serem regidas por números redondos. Essa coisa das décadas provoca em nós uma sensação de mudança, como se passássemos de fase num jogo cujas regras ninguém entende muito bem. Aconteceu comigo. De novo.

Aos dez anos, embora não soubesse explicar, havia uma sensação de importância ingênua, uma excitação por usar o conteúdo de duas mãos pra dizer minha idade, como se isso fosse uma espécie de indicativo entre quem era criança e quem era muito criança. Aos vinte anos, eu me senti adulta. Céus, como eu me achava interessante, madura, pronta para dar conselhos e espanar pra todo mundo um monte de conceitos prontos que eu nem sabia de onde vinham. Deus sabe, e agora eu também, quanto engano há por trás dessa sensação de maturidade que a gente experimenta aos vinte. E chegaram os trinta. É nesse ponto que quero espichar a prosa.

A expectativa de fazer trinta anos me apavorou durante os dois que antecederam o fato. Fiquei muito preocupada com a passagem do tempo e seus desdobramentos, com o tempo que deixei pra trás, com as decisões que precisei (e ainda preciso) tomar e as consequências disso sobre a minha vida e a das pessoas ao meu redor. Nos dois últimos anos, me pressionei muito para acertar - afinal de contas, espera-se de uma mulher de trinta anos, no mínimo, que ela saiba o que fazer da vida, certo? Errado.

Nós temos o hábito de rotular as coisas, os feitos, e estabelecer padrões regidos cronologicamente por algum Big Bang invisível que fica alertando: hora de acordar, de se formar, de dar o primeiro beijo, de casar (ora, você A I N D A não se casou, querida? ), de ter filhos, estar milionário ou pelo menos ser o presidente de alguma empresa, de usar anti-sinais, fazer plástica, ter uma bolsa de marca, parar de chorar, ficar segura. Enfim. E nos acostumamos com essa pressão, como se ela fosse genuína, como se estivéssemos de fato devendo algo ao mundo em decorrência do passar do tempo. Claro que não se pode viver sem responsabilidade alguma ou sem nenhum senso de orientação, mas não sei até que ponto esse frenesi ajuda no processo.

Acontece que o tempo passou e cá estou: Uma Mulher de Trinta Anos. Como eu me sinto? Ótima! Acabei entendendo que se não tem como correr, melhor fazer, não? Essa frase foi de uma amiga/irmã, que passou pela experiência antes de mim. E quer saber? Ela está coberta de razão.

Aos trinta anos, tenho a consciência agudíssima de que nunca vou chegar ao patamar de maturidade dos meus pais, por exemplo. Até porque o tempo passa na mesma velocidade para todos nós e para eles começou antes. De modo que o quinhão que me resta é aproveitar o que posso aprender. Aí vem o pulo do gato: por mim, tudo bem! 

Aos trinta eu me conformei e entendi que algumas coisas eu já sei, outras não. Aprendi que algumas coisas é preciso tolerar, mas tenho aqui comigo uma lista enorme de situações que, sinto muito, mundo, mas não vou engolir de jeito nenhum. Entendi que cururu não é comprimido, mas às vezes precisa virar tira-gosto. Estou começando a descobrir que Sim e Não tem o mesmo peso, embora essa última seja muito mais difícil de dizer. Consegui olhar com mais humor para meus próprios defeitos e me perdoar por algumas escolhas, afinal de contas, foram elas que me trouxeram até aqui. Descobri o valor de se cultivar amigos e que muitas vezes só isso te livra de você mesmo. Entendi que somos nosso pior algoz e, paradoxalmente, nossa companhia mais importante. E que uma pessoa que não tolera estar só, está em péssima companhia.

Aos trinta anos, posso dizer que sei acender churrasqueira, trocar lâmpada, desentupir pias, ralos e companhia, arranho uma forma estranha de fazer fogueira, conserto varal, dirijo em estrada, abro vidro de palmito, cozinho um bocado de coisas, sei os princípios da troca de pneus, escrevo alguns textos, amo desveladamente algumas pessoas por quem valeria a pena morrer, entre outras coisas. Mas não mato baratas, ratos e companhia limitada; não tolero gente má, nem mentira, nem pessimismo. Não me alegro com a desgraça alheia. Não gosto de noticiário, nem de revista de fofoca. Não tenho saco pra gente arrogante e nem pra gente com cérebro de minhoca. 

Talvez eu esteja mais ácida, menos doce, menos ingênua, mais confiante, mais doida, vá saber. Fato é que o Temido Trintão veio como um presente maravilhoso, uma forma de promoção, um upgrade para uma versão melhor de mim. O bonde do tempo passou e eu literalmente me joguei lá dentro.

Melhor ir com a vida, que observá-la passando. Porque o tempo passa, meu bem. Isso é fato. A questão fundamental é: você embarca ou não?

Beijinhos
Fê Coelho





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