segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Sobre marketing e germes



Começou a temporada de crônicas sobre o natal, a beleza das festas de fim de ano e os balanços-gerais acompanhados de metas para o ano que vem. A despeito disso, e talvez por isso, resolvi não escrever sobre esse tema específico. Pode ser que eu chegue lá. É provável que escreva uma carta ao Bom Velhinho, solicitando a bondade de não me presentear com meias e lenços (devido à aquisição de habilidades masculinas, tais como consertar varais, desentupir pias e ralos, entre outras coisas). Fato é que, no momento, não tenho a pontinha de uma unha de vontade de escrever sobre o final do ano. Ao invés disso, resolvi falar sobre a eficiência da equipe de marketing das marcas de sabonete antisséptico.

É de conhecimento público que foi declarada uma guerra aos germes. Bactérias que sempre conviveram em paz com os humanos e até ajudavam a proteger a pele - a chamada microbiota residente - foram colocadas num regime de apartheid asséptico nunca antes presenciado. As propagandas ressaltam a necessidade de exterminar as bactérias de todas as superfícies, ambientes, centímetros de pele e sabe Deus mais de onde.

E aí vem o golpe de mestre: colocar as propagandas em canais infantis! Essa foi a ideia do século, uma que vem sendo utilizada em campanhas educativas diversas, mas não em veículos de comunicação tão eficientes como a televisão. É sabido, o poder de convencimento que as crianças têm sobre os pobres (e ávidos por agradar) pais. Tanto é, que as escolas são alvos de campanhas para conscientização sobre doenças, hábitos de higiene, alimentação e educação no trânsito. Sabe-se que uma criança convencida de uma ideia vai aporrinhar todos os adultos num raio de cinco quilômetros de alcance, até conseguir alguns adeptos.

Dessa estratégia decorrem súplicas e mais súplicas no supermercado, para que os genitores comprem o sabão em pó X, o sabonete Y e o desinfetante Z. O motivo? "Ah mamãe, esse mata meeeesmo os germes". Eu sempre resisti bravamente. Acho um pouco desnecessário essa coisa que querer pôr o mundo inteiro numa termodesinfectora. Provavelmente por birra não compro os tais sabonetes, a menos que tenha um bom motivo - como quando minhas filhas tiveram catapora. Naquela ocasião, as bactérias seriam ruins. Em outras, o que não mata, fortalece.

Acontece que fomos ao parquinho de areia, eu, minhas filhas, minha irmã e meus sobrinhos. Na volta, ao chegar à casa da minha irmã, fui dar um banho nas crianças. Preciso contar uma coisa: "de mamando a caducando", todas as quatro crianças comemoraram o fato de que iam tomar banho com o tal sabonete antisséptico da tampa vermelha. Não parecia um banho, aliás. Era, antes, um batismo de limpeza, uma passagem de uma vida com germes para outra sem eles.

Fiquei de queixo caído com a adesão das crianças à propaganda. Tanto que precisei experimentar. Eu tinha que saber o que acontecia. Esperei, inclusive, que saíssem fagulhas ou tocasse uma musiquinha ou algo do tipo. Mas nada aconteceu. Continuei com a pele sobre o tecido subcutâneo e este sobre os músculos que se inserem nos ossos. Não fiquei mais bonita ou mais rica. Não fiquei mais saudável, nem mais doente.

OK. Escritora de pouca fé. As bactérias são invisíveis a olho nu.

Concordo, mas recuso-me a acreditar que fui enganada durante tantos anos. Quer dizer, por duas décadas - quase três - acreditei que ficava limpa tomando o bom e velho banho com bucha e sabonete comum. O que foi feito disso agora? Será que eu passei a vida suja, ou as coisas estão tomando um rumo exagerado hoje? São respostas que eu não tenho para fornecer. Tenho cá minhas suspeitas, que provavelmente não poderiam ser expressas sem o risco de um processo.

Uma coisa é certa: das crianças que eu conheço, uma boa parte passou por uma lavagem cerebral antisséptica.

Beijinhos
Fê Coelho

1 comentários:

Lilian disse...

Belo texto.
Feliz 2012

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