O texto abaixo é um conto escrito por mim e publicado pelo meu amigo, Haziel, na revista virtual Extremezine. É uma história de um personagem que me incomodou uma noite e mais um dia - de modo que eu soube que era o velhinho certo (Uma risada aqui). Espero que o enredo possa transformar para melhor o dia de alguém.
Beijinhos
Fê
O Garimpeiro das Palavras
Quem passa pelo senhor de cabelos brancos, olhos brilhantes e sorriso afável não sabe ao certo o que ele busca. Não se pode imaginar que aquele homem, curvado pelo tempo como o junco pela tempestade, sempre atento e observador, é um garimpeiro. É bem verdade que esse senhor garimpa tesouros diferentes: seu interesse é pelas palavras.
Não há um lugarejo, vila, aldeia, cidade ou caminho que ele não tenha percorrido. Sua busca é incessante, porque algumas palavras estiveram escondidas. E é atrás dessas expressões que ele vai: o senhor procura pelas palavras que foram perdidas, pelas que deixaram de ser usadas. Nem todas as palavras fazem falta – os verdadeiros tesouros são aquelas que podem mudar as pessoas. O andarilho procura pelas palavras doces, amigas e por aquelas que podem trazer algo de bom.
Naquela ocasião ele procurava uma palavra específica: gentileza. Caminhou muitos dias, procurando em todos os lugares, sem encontrar uma vez o seu pequeno tesouro.
“Gentileza é algo fora de moda”, disse uma mulher muito altiva e cheia de rolos de tecido nos braços. “Pode ser”, respondeu o senhor – que não tinha o hábito de se abater – “mas se me permite, eu gostaria de te ajudar a carregar seus tecidos”. E o senhor acompanhou a mulher até seu destino, despedindo-se com um sorriso.
“Não conheço essa palavra”, disse uma criança “e me desculpe por não ajudar o senhor, mas é que preciso mesmo consertar o varal para minha mãe.” O andarilho ajudou a criança e se despediu contente por ter sido útil.
“Não tenho tempo para procurar palavras agora”, disse um senhor com feições severas, “preciso ferrar esse cavalo e descarregar uma carroça de feno”. O garimpeiro das palavras descarregou a carroça e se foi, sempre em sua busca pela gentileza.
Durante muitos meses, o andarilho caminhou, esquadrinhando os caminhos, procurando pela palavra perdida. Então resolveu voltar. Fez exatamente o caminho que tinha percorrido anteriormente e qual não foi sua surpresa ao encontrar gentileza espalhada por todos os lugares. Aquilo que era artigo raro, agora era fartura. Algo havia mudado e ele precisava compreender.
O senhor adentrou uma vila e procurou por todas as pessoas com quem tinha falado, sem no entanto reconhecer nenhuma delas. Foi, contudo, a criança, a única a reconhecer o andarilho.
“Encontrou o que procurava?”, perguntou a criança com olhos curiosos. “Até mais do que imaginava”, respondeu o garimpeiro. “Todo o lugar está cheio de gentileza. Sabe me dizer o que aconteceu?”.
E a criança explicou.
“Quando o senhor me ajudou a consertar o varal da minha mãe, eu fiquei muito agradecido. Foi muito bom receber a sua ajuda. Então eu corri atrás para agradecer e foi quando eu percebi que o senhor deixava cair sempre a mesma palavra no chão, por todo o seu caminho. Apanhei uma delas e levei para os meus pais. Então eles me explicaram que palavra era aquela: gentileza. E me disseram que é uma virtude, uma coisa muito boa, que faz as pessoas se sentirem melhores. Me explicaram que gentileza não custa nada e que um ato gentil é capaz de salvar uma vida da tristeza, do abandono e até mesmo da morte. Eu acredito neles. E o senhor?”
O andarilho enxugou uma lágrima e sorriu afetuosamente para a criança. Afagou-lhe os cachos e se levantou.
- Eu não poderia duvidar de uma verdade tão intensa. Obrigado, minha criança, por ensinar a esse velho homem o valor de seus próprios passos. Você foi de uma gentileza incrível. E agradeça aos seus pais por mim.
O garimpeiro nunca mais foi visto por aquelas bandas, mas vez ou outra alguém encontra gentileza em seu caminho e se pergunta: “de onde terá vindo?”.
Fernanda Coelho
11 comentários:
Fernanda!
Que coisa mais linda! Que texto forte, menina! Recheado de reflexões e ensinamentos. Adorei. Li e reli. Parabéns. Já o carreguei comigo, e com os devidos créditos, óbvio, fará parte de meus guardados.
Bjssssssssss
Obrigada pelo carinho, Marli.
Fico muito feliz que a história tenha feito da diferença no seu dia.
Um beijo grande
Fê
Fê vc é uma fofa. Muito bom passar por aqui.
Um beijo
Mih
Escreveste uma linda mensagem para todos, beijo Lisette.
Muito obrigada pela visita, Mih e Lisette. Fico muito feliz com a passagem de vocês por aqui.
Beijos e uma boa semana.
O time do chefe Hazi é realmente uma elite =D
Belo conto Fê! sempre nos fazendo lembrar do que realmente é importante na vida, com leituras mais que prazerosas.
bjO!
[finalmente minha net me autorizou a comentar no seu blog, antes nem essa janela carregava... hahaha agora aproveitar]
Que bom que vc gostouu :D
Deu um trabalhão achar um poema que casasse com o que eu tinha em mente, hehe. se tivesse um dom de escrever como vc, eu estaria feito :D
abração e parabens por mais este post maravilhoso.
Fê, que conto mais encantador!!!
Vc aborda os temas com muita graça, beleza e sabedoria!
A gentileza está mesmo em desuso, e no lugar dela figura o individualismo, o egoísmo dos tempos modernos. Eu tenho saudades do meu tempo criança quando as pessoas sentiam prazer em serem gentis umas com as outras. Lembro da minha mãe preocupada com a roupa estendida no varal da vizinha ausente quando “armava” um temporal. Ela ia lá e recolhia a roupa. Eram atos simples, mas que faziam toda a diferença.
Como diz a cação, velhos tempos, belos dias...
Um bjo enorme.
Obrigada, André, Andrebdois e Su, pelo carinho.
É isso que mantém a vontade de escrever.
Abraços.
Boa tarde.
Estou lhe seguindo. (Maria) Amapola.
Voltarei depois, para ler com mais calma.
Um grande abraço.
Obrigada pela visita, Amapola. Seja muito bem vinda.
Beijo
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