Era o homem, seu caminho e sua carga - um saco de juta, cheio de coisas. Um homem jovem, saudável e forte; um caminho longo e difícil de se cumprir e uma carga suportável, a princípio. Tudo o que ele precisava fazer era levá-la até o final do caminho. Nenhuma novidade, até então. Muitas pessoas têm trilhas a cursar e fardos a transportar. O que difere este homem específico é o fato de que seu carregamento variava de acordo com o sua atitude.
Para cada situação que se apresentasse ao longo da estrada, a depender da reação do andarilho, acrescentava-se peso ou retirava-se. Caso o homem se irritasse ou praguejasse, uma pedra era acrescentada ao saco; caso sorrisse ou visse o melhor da situação, uma pedra era retirada. E assim ele prosseguia, transportando sua carga por caminhos ora escarpados, sinuosos e incertos, ora floridos, planos e cheios de vida.
Ocorre que, tendo tomado a rabugice por estilo de vida, o homem, ao longo do tempo, se viu obrigado a carregar um fardo muito maior do que poderia suportar. Havia juntado pedras demais, ele sabia. Encontrou pela estrada um homem que fazia o mesmo: levava consigo seu saco de pedras e outras coisas; um saco bem menor, ele notou. Não era justo! Tantas coisas terríveis haviam acontecido com ele e ainda era necessário levar aquele fardo tão pesado. Enquanto isso, o outro homem sorria e caminhava a passos ligeiros, mal percebendo sua própria carga. Pediu ajuda e recebeu. Mas depois de alguns quilômetros, a divisão sobrecarregou o companheiro de jornada e este devolveu ao homem suas pedras. E ficou pelo caminho, se recuperando do esforço.
O homem encontrou pessoas em casinhas bonitas e ofereceu suas pedras como presente. E quem gostaria de recebê-las? Ninguém. E o homem seguiu sua trilha, carregando um peso que era só seu.
O andarilho sentia-se só, fraco e vencido. Seus passos vacilavam. Até que ele tropeçou e caiu. Seu fardo soltou-se de suas mãos, subiu bem alto, contrastando com o céu de infinito anil e chegou ao solo, espalhando mil pedras ao redor do homem. Eram tantas, de tão diversas queixas; e formavam no chão um mosaico tão desconexo de reclamações, que o homem não viu alternativa senão rir. Ele gargalhou como nunca fizera. Riu de si mesmo, de suas convicções e da inutilidade do peso que carregava. Reconheceu a impossibilidade de transferir a outras pessoas um fardo que ele mesmo havia montado. Riu-se de sua insistência em permanecer agarrado a partes do caminho que tão longe já estavam. E decidiu que não queria mais nenhuma daquelas pedras. Nesse dia, houve uma risada tão longa, como poucas vezes já se viu.
Então o milagre aconteceu: uma a uma, as pedras tornaram-se flores. Cada uma de suas lamúrias deixaram de ter importância, porque o homem compreendeu que pouco importava o fardo; o caminho, sim, era fundamental.
Juntou tantas flores quantas conseguiu e as distribuiu pelo caminho. E deixou de se preocupar tanto, e de se importar tanto com coisas de menor valor. Fixou-se à verdade das pessoas, à luz de cada dia, aos olores e aos sabores; fez-se amigo dos amigos e afastou seu caminho dos inimigos. Distribuiu sorrisos, aprendeu a rir de si mesmo e tornou seu fardo o mais leve que poderia ser.
E finalmente foi feliz. Porque descobriu que o destino - esse caminho que trilhamos, cada um a seu modo - pode nos apresentar momentos floridos ou áridos. Mas a vida, essa que carregamos até o final da jornada, pode e tem exatamente o peso que escolhemos levar.
Beijinhos
Fê Coelho.
0 comentários:
Postar um comentário