sexta-feira, 22 de julho de 2011

Entre aspas



Estava aqui olhando as pessoas postarem citações e o pensamento voou. Foi inevitável, como tantas vezes acontece e me vi no meio de um questionamento: será que, quando cita um autor, a pessoa tem noção do que isso pode representar?

Desde a minha infância, passando pela adolescência e chegando à idade adulta, um desejo sempre se fez presente: saber cantar. Eu gosto de música e me sinto feliz cantando. Mas, bem, não ocorreu que eu me tornasse uma cantora. Para ser sincera, não posso nem dizer que encontre facilmente o tom de uma música. 

Então é isso. Não sou uma cantora. Não aconteceu de eu me tornar o que eu tinha imaginado. Por outro lado, ocorreu o inesperado: as palavras me encontraram. E, se digo isso, é porque foi exatamente o que aconteceu. Não saí por aí tentando escrever nadica de nada, simplesmente aconteceu. E, depois de ocorrido, não há como voltar atrás. Virei escritora. Fazer o que, se não consigo mais viver sem isso? Remediar de que jeito, se vez ou outra uma crônica fica batendo na porta da consciência, pedindo pra voar?

E é nesse ponto que quero retomar o pensamento índice do texto. Você aí, leitor, tem ideia da importância que tem para um ser que escreve? Você imagina o quanto um autor te aguarda? Tem noção de que o correr de seus olhos por nossas linhas é uma visita muito esperada? E, dito isso, compreende que a citação é o mesmo que elogiar a comida da avó, ou falar bem do tratamento recebido na casa de um amigo?

Quando vejo palavras entre aspas ladeando um nome, imagino: será que um dia vai acontecer comigo? E me lembro de ter lido em algum lugar que o Caio Fernando Abreu queria ser amado por algo que houvesse escrito. Acho que a coisa toda passa por aí, porque, bem ou mal, todo autor se entrega nos textos. Não importa se a obra é de ficção ou a emissão expressa de opiniões, o autor está lá - nos pensamentos, nas sensações, na escolha das palavras. Um texto é uma espécie de radiografia da alma do autor, que pode até estar desfocada, mas que ainda assim é uma imagem. 

E fico me perguntando: quando é que vou escrever algo digno de aspas? Será que vou deixar de engatinhar e me tornar uma escritora bípede, alta o suficiente para alcançar os dois tracinhos acima das palavras?Acho que essa resposta só poderá ser dada pelo tempo e pelos leitores. 

Enquanto as aspas não vêm, vou fazendo fotos escritas de mim mesma, colocando um pensamento aqui e outro acolá, brincando com as palavras e me divertindo com elas. Elas me encontraram, agora me aguentem.

Beijinhos
Fê Coelho


quarta-feira, 20 de julho de 2011

Permitam-me apresentar...



À beira de completar dez mil acessos no blog, permitam-me apresentar novamente a pessoa que enche as vossas cabeças de caraminholas. Já posso imaginar o pensamento do leitor neste exato momento: xi, lá vem a doida de novo. Eu tenho um ponto, pessoas, prometo. Vamos lá.

Olá. Meu nome é Fernanda Coelho. Sou um ser humano remendado e refeito por suas próprias mãos e pela dos outros seres humanos. Sou resistente às intempéries da vida e comprovadamente disposta a não me permitir o capricho de ficar na lona. Sou doce com os amigos e impaciente com as vítimas. Continuo otimista, mas aprendi que nem sempre os dentes precisam estar à mostra. Sou uma pessoa corajosa, embora tenha crises de fragilidade. La vou amadurecendo e isso está, cada vez mais, me mostrando o quanto o caminho ainda é longo.

Tenho os pés firmes no chão, mas minha mente voa. Reparo em coisas que muita gente deixa passar e o contrário também acontece.

Sou moleca além da conta, mas isso não significa que seja infantil. Talvez os anos me digam o contrário, mas isso é uma projeção hipotética.

Tenho uma boa família, bons amigos, bons sonhos e um bom coração. Isso tudo transborda em alguns textos, que o leitor me dirá se são bons ou não.

Qualquer semelhança com a autora que se apresentou na primeira postagem do blog não é mera coincidência. Ocupamos o mesmo corpo, mas a alma que hoje fala aos leitores é infinitamente mais livre que a de algum tempo atrás.

Espero que apreciem as mudanças.
Um beijo a todos
Fê Coelho

sábado, 9 de julho de 2011

Eu e a Isaura



Um dos meus relacionamentos mais antigos e conturbados não é, acreditem-me, com um homem. E antes que imaginem que tenho tendências que não me são próprias, eu explico: esse relacionamento também não é com uma mulher, assim de carne e osso. Meu caso, rolo, borogodó, carma, ou coisa que o valha é a Isaura - entidade faxineira, invisível, pensante, falante, controladora e palpiteira até o último fiapo do avental com estampa de joaninhas.

Nossa história começou muito cedo, ainda em tenra infância, quando uma vez a Isaura acabou por me convencer que minhas gavetas estavam o próprio Hades. Lembro-me de ter tirado tudo lá de dentro, pego um pano pra limpar as gavetas e, enquanto recitava o cordão de lamúrias da Isaura, ter ajeitado tudo no lugar novamente. Recordo-me que no começo até gostei da arrumação toda, mas no final das contas minha revolta chegou.

- Ah, Tia Isaura (na época eu não tinha coragem de enfrentar a Isaura), será que não dá pra colocar as roupas de volta sem dobrar?
- Claro que não, docinho (na época, ela era mais gentil comigo). Agora seja uma boa menina e dobre as roupas antes de guardá-las.

E eu obedecia, como sempre.

Acontece que o tempo passou e tornei-me uma adolescente rebelde, disposta a enfrentar a Isaura ao menor sinal dos seus pitacos. Não gostava de lavar louça, nem de limpar a casa. Detestava lavar os banheiros e a garagem, lavar e passar roupa, tirar a poeira dos móveis e lustrá-los. E se as mudanças aconteceram comigo, bem, não seria diferente com a Isaura. Ela se tornou ainda mais exigente, rabugenta e insistente. Acredito, inclusive, que ela precisa de terapia e de uma boa dose de antidepressivos. Não é normal, uma entidade ser chata daquele tanto!

-Tá bom, Isaura. Já te vi aí no canto da sala e já sei que a louça está na pia. Agora, será que dá pra parar de bater o pé no chão? Está passando o clipe novo do Aerosmith na MTV e eu gostaria muito de ouvir.
-Como eu detesto adolescentes! - respondia a mal-humorada Isaura - Estou doida pra você acabar de crescer logo. Quem sabe assim posso me aposentar e ir curtir meu status de entidade aposentada em algum lugar branco e asséptico. Olha aí, o clipe acabou. Agora, será que dá pra acabar logo com as poucas tarefas que você tem? Ah! Não se esqueça do montinho de sal que está caído no canto do balcão. Os cantos são muito importantes, ok?

Eu bufava e ia para a cozinha ou para o canto da casa que me estivesse destinado para limpar, esfregar ou o que quer que fosse.

- Já te contei que esse seu avental de joaninha é completamente cafona? - eu alfinetava.
- Ja te contei que cafona é uma palavra completamente desatualizada para uma adolescente?
Filha da puta da língua afiada, pensava eu, enquanto pegava o material de limpeza.

E assim nossa história foi se desenrolando, cheia de embates e conflitos, mas com seus momentos de trégua. Alguns dias são bons, especialmente quando eu acordo descansada e de bom humor.

- Bom dia, Isaura querida. Linda oportunidade para um tapa na casa, não?
- Tapa? Que isso, menina! Hoje nós vamos ar-ra-sar. (A Isaura adora quando eu estou de bom humor). Liga aí uma música bem alta, enche esse apartamento de água e vamos esfregar tudo, que é pra ficar bem limpinho. A propósito, te disse que seu cabelo está ótimo hoje? (Ela sabe o jeito de me ganhar, danada)
- Obrigada, Isaura.

E nesses dias a gente se entende. Esfregamos tudo juntas, limpamos, lustramos, jogamos sacos e sacos de coisas fora. A única coisa que ainda não consegui ensinar pra ela é que quanto mais espuma no chão, mais difícil é o enxágue.

 Desconfio que ela já tenha entendido, mas que lá no fundo se divirta me torturando. Digo isso porque, de vez em quando, vejo um brilho maldoso nos seus olhos miúdos. Ela torce a barra do avental de joaninha e me sorri.
- Estou tão orgulhosa de você hoje, querida. - Bajula-me a sorridente Isaura.

E eu, cá do alto do meu cansaço, penso:
"Isaura, sua filha da mãe, pegue esse seu avental de joaninha, seu material de limpeza, os panos, o rodo, a vassoura e toda a parafernália e vá pro inferno! Ah, só pra te avisar, estou indo fazer as unhas."

Beijinhos
Fê Coelho.
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