Alguns textos, confesso, foram destinados às gavetas. Alguns escritos são meus, tão profundamente meus, que se recusam a conhecer as pessoas. São palavras que não cabem na vastidão do mundo interior, que se perdem na agonia de não ser e acabam rompendo caminho dedos afora. Mas feito isso, simplesmente não sabem mais pra onde ir.
Ah! mas essas palavras, atrevidas e melindrosas, se fazem escrever só para se afirmarem; só para mostrar quem manda mais. E depois de escritas se fecham num silêncio devoto, numa timidez infinita, e acabam se escondendo atrás de um outro texto qualquer.
Ah! Se elas aceitassem o olhar do outro... Ah! se decidissem passear gaveta afora. Quem sabe seriam mais felizes, quem sabe mais leves. Quem sabe encantassem mais que outras. Porque são belas. Como são belas, as danadas! Escritora desonesta? Não creio que seja esse o caso. Talvez sejam as palavras que são honestas demais, puras além da conta, desprovidas da couraça de conveniência que vai bem com esse mundo. Talvez sejam palavras em carne viva, que simplesmente estão desprotegidas demais para enfrentar o espaço além da gaveta.
Todo escritor, creio eu, tem seus textos frágeis. Todo mundo tem suas palavras de fio desencapado, prontas pra ferir. E todo mundo tem suas linhas tortas. Cada pessoa guarda sua coleção de verdades inconfessas, de mágoas bem acolhidas e de sonhos embrionários que precisam de proteção.
Todo mundo tem uma parte de si que se mostra e uma que se oculta. Uma verdade que se encolhe e outra que se espreguiça. Cada um tem sua névoa, sua quota de bruma. E somente alguns - os mais brilhantes, os mais libertos, os mais ousados - conseguem trilhar seu caminho para além de tudo isso.
Parte de mim inveja essa capacidade; outra parte comemora. Parte de mim admira, outra parte se atemoriza.
E sinto-me gestante dos textos que não querem nascer.